Lançamento de documentário Ribeirão dos Padilhas
Nesta quarta-feira (20), às 19h30, será lançado o documentário “Ribeirão dos Padilhas”, na Cinemateca de Curitiba. Com direção de Gustavo Castro, a película fala sobre o grande fluxo de migrantes vindos de zonas rurais do norte do Paraná a partir da década de 70.
A ocupação de terrenos vazio em bairros periféricos contrastando com o sonho de uma vida melhor, entre estes espaços, estava um as margens do Ribeirão dos Padilhas. Embora alguns avanços tenham sido alcançados por estas comunidades, parte destes moradores até hoje não tem a documentação de posse dos seus terrenos. Em meio a todos estes problemas, os moradores restabeleceram a ordem social por intermédio do seu trabalho e sua organização no dia-a-dia.
O Declatra ouviu, com exclusividade, a coordenadora da Associação de Moradores Amigas das Vilas, que representa a comunidade do Ribeirão dos Padilhas, Libina da Silva Rocha e o advogado Bruno Meirinho, um dos advogados envolvidos com as reivindicações da comunidade.
Acompanhe a entrevista:
Declatra: Como surgiu a ideia de produzir o documentário?
Libina: A comunidade do Ribeirão dos Padilhas reivindica regularização fundiária. Essa regularização deve ser feita pelo poder público, isto é, pela prefeitura. Já faz tempo que estamos pedindo isso e às vezes ouvimos da Prefeitura justamente o contrário: eles dizem que querem remover nossas casas desse local, demolir tudo! Na COHAB-CT falam muito em números, metragens, recursos, dinheiro, etc. Mas e o nosso direito? A gente queria mostrar que o Ribeirão dos Padilhas não é um amontoado de números, mas sim que somos gente, somos famílias, somos lares, histórias, trabalho, e que nós queremos o direito à nossa moradia nesse local. Com a ajuda do Gustavo Castro, diretor e documentarista, nós pensamos em elaborar um filme sobre a nossa história, para mostrar que existe vida nessa comunidade.
Bruno Meirinho: A realidade da comunidade é muito marcante. Quando ouvimos pessoas da Prefeitura falando em remover as famílias, e quando vemos a comunidade como ela é, consideramos absurda a ideia da remoção. O bairro está todo consolidado, é uma agressão muito grande simplesmente pensar em remover essas casas. O documentário foi uma forma de trazer a comunidade, de mostrar essa realidade para mais gente. Quem teve a ideia foi a Líbina, Coordenadora da AMAV, com a Denise Filippetto, e teve o apoio para a realização do documentarista Gustavo Castro.
Declatra: Quem são estes migrantes que chegaram em Curitiba?
Libina: Olha, é muita gente. As pessoas vieram de várias partes, meu pai, por exemplo, trabalhava em uma fazenda de café no interior. Daí veio a geada… mas também aconteceram outras coisas. Falavam para ele que na cidade ele poderia ter mais acesso às escolas, a bons empregos, e dar um futuro melhor para os filhos, e ele veio para Curitiba, por volta de 1980. Aqui no Ribeirão dos Padilhas ele achou um terreno onde conseguiu erguer uma casa, de madeira. Eu nasci aqui, tenho 31 anos. Meu pai e minha mãe vendem doces que eles fabricam aqui em casa. Depois de muitos anos de trabalho, conseguiram reformar a casa, hoje moramos melhor, mas ainda não temos o documento do terreno.
Bruno Meirinho: São trabalhadores do campo que vieram para Curitiba em um período de grande migração no sentido campo-cidade, que no Paraná ocorreu nos anos 70. Além do fenômeno da geada, que destruiu cafezais, acredito que foi muito determinante o processo de industrialização da capital, que exigia a presença de trabalhadores na cidade. Além disso, muitos moradores procuravam uma vida melhor na cidade, com acesso a saúde e educação. Hoje a comunidade não tem apenas migrantes, pois alguns já mudaram para outros locais, ou deixaram na comunidade os seus filhos. Então existem pessoas que vieram de outros bairros também, a comunidade fica em um local de bom acesso, no bairro Xaxim, próximo à Linha Verde.
Declatra: Como eles se organizaram?
Libina: Os moradores se organizam na Associação de Moradores Amigas das Vilas – AMAV. Esta associação se formou no período mais crítico das ameaças da Prefeitura, em 2011, quando o discurso do Poder Público era o de que iria expulsar todos os moradores do local, demolindo as casas, etc. A comunidade existe há cerca de 35 anos, mas as ameaças mais graves ocorreram nos últimos 3 anos, exigindo o fortalecimento da organização comunitária. Por enquanto estamos resistindo dessa forma, fazemos assembleias, reuniões de quadra, reuniões por rua, para debater nossas propostas e manter todos os moradores unidos diante de qualquer ameaça.
Bruno Meirinho: A comunidade formou uma associação de moradores chamada Associação de Moradores Amigas das Vilas – AMAV, sob a coordenação da Líbina da Silva Rocha. Os moradores de reúnem em assembleias e reuniões de grupos. São muitas casas. São cerca de 300 famílias.
Declatra: O que fazem hoje em sua maioria?
Libina: Os moradores trabalham nas mais diversas atividades. Tem motoristas, operários, trabalhadores do comércio, autônomos. E também tem muita gente que trabalha em casa, já falei o exemplo do meu pai, que faz doces, tem um outro morador que é alfaiate, tem moradores que tem um pequeno comércio em casa, existem várias costureiras, enfim, prestadores de serviços.
Bruno Meirinho: São todos trabalhadores. Alguns realizam atividades em casa, outros são trabalhadores formais em diversas atividades, em geral ligados ao comércio e serviços.
Declatra: Quais são as suas aspirações hoje, 40 anos depois?
Libina: A comunidade pede a regularização fundiária, que é o direito a ter o registro dos imóveis, reconhecendo a propriedade dos moradores nesse local. Os moradores estão muito insatisfeitos com essa situação de ameaçar de expulsão, depois de tantos anos vivendo aqui. Nós melhoramos nossas casas, tudo isso teve um custo, mas também tem o sentimento. Uma coisa é sair de uma casa porque você quis, de repente as pessoas querem se mudar para outro lugar, é normal. Outra coisa é alguém vir e mandar você sair da sua casa.
Bruno Meirinho: Hoje a comunidade tem boa urbanização, as ruas estão pavimentadas, têm serviço regular de água e luz, e existe inclusive ligação regular à rede de esgoto, portanto o rio não recebe água de esgoto desta comunidade. Eu diria que a principal demanda deles é terem um registro de propriedade, para poder deixar uma herança para seus filhos, e também para não serem mais ameaçados de despejo.
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